quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

Na trilha dos beijos cruéis



BELAS BALAS IN BLUES

são teus versos que espalham a descrença das canções que conheço 
aqueles desgraçados que amassas sem trégua entre sacristias e balcões 
para restar só a chama da bala rasa ou tuas unhas manchadas de malbecs

sim, minha lady

são as mãos que troçam do ferrugem na vagabundagem dos raspões
é viela chapada de solidão porque não há nada mais além do meu blues

só metal em cinzeis espalhados no ocre das tintas 
e janelas molhadas por crias à toa de todas as revelias

ficam aquelas luas alquebradas em lábios nus
por lolitas inocentes na fuga dos beijos crueis

apenas um hiato de tempo que dança
por aniquilar poetas mulambos ao sol

há mundança de birutas
e atolagem de esperanças

no que realmente se acredita 
do que se possa arriscar na veia

o vento trepida agulhas nas vitrolas
são sacudidelas em temperanças

e eu sei apenas que nada nada sei.
ouvindo buddy em cismas de pessoas

e nada mais sei, David... 
e nada mais sei, Louis...
do que um três por quartos de fotografias.

© 2016 antonio pastori
arte: Janel Eleftherakis, “Playing the Blues #3


A Rota dos Pássaros Rubros (V)

O QUE RESTA DO PEREZ CRUZ


na cantina do baile de névoas
vem um sotaque em lume de espelhos
uma coroa por enxame dos bardos
vem a morte das troças sem linhos violetas

perto do que é rubro
da lua ser de tardinha
das horas em quereres livres

porque são lentas as veias e alquimias 
pelas aquarelas das ruas sombreadas

e se dedilhas os rios no decurso do tempo
inventas duas mil e uma das noites
antes do que queira à beira
virar anoitecer

perto do último incêndio
sem estradas de outonos

existe sim
existe alguma coisa por dizer…

pelo pousar das bicicletas 
pelo que resta do Perez Cruz

por ser forjado a guerras
no abandono dos ventos

por desenhar bolas japonesas
na trilha de olhares na neblina

mas o que resta é apenas a ópera dos vencidos
e se bem me lembro, nenhuma é o que parece

ao saber que relógios são pobres gaiolas velhas
e o tempo um desencanto nas mesas em contraluz

das cantinas de névoas poentes viventes
em dormências de temporais e saturnos

porque no mundo dos poemas em relicários
se bebe vida até a úlima gota do último dia

perto do que seja espera 
ou do que for para sempre

ali bem no meio da rua
em um sorriso na praça
a cortar o tempo à faca
além do que for adeus

porque roubaste do Perez Cruz
a mesma lua das horas livres
pouco ali do que foi de tardinha

e assim só vemos o rastro na rota dos pássaros rubros

de teus bailes suspensos corados de sangue e azul
a espelhar o poema entre as bicicletas na neblina.

junho, 2016
© antonio pastori
Arte: Wine Tasting - Camilla, Saturno Buttò © Tutt'Art