terça-feira, 25 de dezembro de 2018

De Baús Velhos


PARTO DE ADEUS


a sala vazia aquieta o corpo 
e a mordida do lábio.

nada impede aos dedos 
acalentarem contornos no vazio.

venta.

catas os nomes e o que dizer
o tempo escorrido no que deixar

e poder já não importa

o imã das perdas
penduras entre as boinas

o mar dos silêncios
é poema de escuro

é parto de adeus
feixe de baú velho  

e o amor está crivado de balas nas adolescências
e o amor avança o sinal de volantes desgovernados
e o amor  é sem cama em coma na mancha sem manual

o amor é massa
o amor é mossa 

e atrás da porta
no meio da boca
nos vincos da testa 

a espera é dor

e venta.

salvador, 04 de novembro de 2014
© antonio pastori
Arte: a Gust of Wind 1886-87 ©Judith Gautier

terça-feira, 18 de dezembro de 2018

Dias descem de estrelas


A CRIA DOS VAGÕES SEM JAZZ


tarde és e vês que andas e relembras ante a persianas banguelas
é dezembro ao longo do descampado de areia, chumbo e vidraça,  

eu espalho lápis na inquietude dos risos
por esconder aquarela à sanha de nimbus
por amealhar culpa no querer dos tinteiros

onde vais sei que danças e danças arteira
e boêmios no cio da cidade eriçam insônias

onde corres ofegante vi que mal anoiteces
e já nem sei mais sobre ponteiros e relógios
porque apenas te espero na soleira dos mundos

e assim
monet puxa mato
hiato beija minuto

dia desce de estrela
cria sempre nasce crua

por me fazer voltar
por te espraiar demais

poetas são párias à toa
silêncio só fecha janela

dezembro já vai vês que ainda choras e andas ante a balaustrada

tarde és para vultos à beira
tarde és no vagão sem jazz

e mãos se atracam por ilhas de folhas e rugas
dessas estradilhas nervosas das águas
escolhem adeus entre as tralhas de agora

porque se tarde és
sabes bem onde vi a manhã
e mal advinhas onde troveja.


Dezembro, 14
© antonio pastori
arte: Gare Saint Lazare Station (Claude Monet, 1877)